segunda-feira, 5 de maio de 2014

Internação Involuntária





“Amá-los com todas as nossas forças, significa resguardá-los deles próprios e, mesmo que a princípio não entendam desta forma, mesmo assim, precisamos fazê-lo o quanto antes.”

Muitas vezes nos perguntamos se estamos sendo duros demais com os nossos adictos ao tomarmos a decisão de interná-los involuntariamente, e sabemos que tomarmos tal decisão, exigirá de nós uma força quase descomunal. Nestas horas, precisamos ser firmes e fazer por eles, o que não conseguem fazer sozinhos. Porque, em um dado momento, muitos dependentes chegam a um estágio da doença que perdem até mesmo o poder de escolha e decisão. Estou me referindo a um dilema que muitas vezes compartilhamos ao especularmos a possibilidade de retirá-los de circulação contra a própria vontade. Ao tomarmos esta decisão poderemos nos sentir o pior dos seres humanos, porque teremos a sensação de estarmos sendo covardes e cruéis, mas não é bem assim. Precisamos protegê-los deles próprios. Mesmo que esta internação tenha apenas um efeito parcialmente paliativo, pois, o tiro pode sair pela culatra e o procedimento funcionar ou não. Mas, precisamos fazê-lo mesmo que isto doa demais, por que a dor de não fazer nada e ver um ente querido morto é muito maior do que aquela que poderemos sentir ao constatarmos que depois que a vida se foi, nada mais poderá ser feito.
“Fui internada contra minha própria vontade, no ano de 1998. Naquele momento, senti-me péssima. Na verdade, eu me sentia vítima de um grande complô organizado pela minha mãe e pelo meu ex- marido. Realmente, achei que a minha família estava desistindo de mim e que internar-me a força, era uma boa forma de se livrarem do peso que me tornei em suas vidas. O tempo passou e pude ver o quanto me amavam e como foi difícil para eles tomarem a decisão de me internar involuntariamente. Percebi que agiram certo e, no momento mais crítico da minha adicção ativa, eles me resguardaram das minhas insanidades e salvaram a minha vida. Foi uma cena feia: de um lado o psiquiatra, do outro a minha mãe e o meu ex-marido, e eu, achando que tudo não passava de uma encenação. Só entendi a gravidade da questão, quando ouvi o médico perguntar para eles: Ela tem alguma condição de convívio social? E, eles responderam em coro: Não! Então, percebi que estava em maus lençóis, ao ver dois enfermeiros me segurando pelo braço e levando-me embora para uma ala psiquiátrica. Foi horripilante. Chorei muito, não pelo fato do afastamento social, mas pelo fato de não poder mais usar drogas estando confinada ali. É difícil entender que sentimento era aquele, pois eu deveria estar pensando na minha família e não em me drogar novamente. Mas os meus valores estavam reduzidos a zero, e nada era mais importante do que usar, nem mesmo a minha vida era importante naquele momento. Adentrar em uma ala de psiquiatria e ver aquelas pessoas babando, nuas e totalmente desconexas do mundo aqui fora, foi um choque para mim. Talvez, eu tenha tido o meu primeiro despertar espiritual lá, naquele hospital. Por que de repente tudo ficou muito claro. Parece que me foi retirado o véu da ignorância, quando sentada no pátio daquele hospital, olhei ao meu redor e pensei: Darléa, o que você está fazendo com a sua vida? Por que quer morrer? Por que não luta? Não desista de você! Queridos, não sei se fui eu quem pensou ou se foi a voz de Deus, mas analisei bem as perguntas e me questionei se ainda existia uma chance para mim, depois de tantos sacrilégios que cometi com a minha vida. E, decidi tentar modificar tudo que havia vivido até aquele momento. Quando saí da internação, voltei aos grupos de mútua ajuda e, apesar de tantos altos e baixos, estou conseguindo ficar limpa. Consegui resgatar a minha dignidade. Não posso afirmar-lhes que foi ou não o efeito cascata que a internação me deixou, que me levou a tomar uma decisão de parar com as drogas, mas com certeza, ao vivenciar tudo que passei em uma internação, decidi que não queria mais aquilo para a minha vida. E, a única forma de não voltar mais para aquele lugar, seria e ainda é, não voltar a tomar aquela primeira dose.”

Por: Darléa Zacharias

(Trecho do livro Inimigo Oculto - Foco, Força e Fé, capítulo: Adicção e codependência: uma mistura explosiva!)

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